Anunciado: Série 1 M Coupé
Não sabemos apreciar carros
Agora que tenho a vossa atenção, deixem-me explicar. Não é que não percebamos de carros em si. Sabemos muito sobre motores, mecânica, consumos, qualidade dos materiais, etc.
O que não parecemos saber é apreciar a combinação dos vários elementos que compõem a experiência de conduzir. Isto não é um fenómeno único ao nosso país… de facto, em qualquer ponto do mundo ocidental, quando se fala de carros costuma-se focar exclusivamente a potência ou a velocidade.
A questão é que noutros países, como o Reino Unido, a Itália ou a Alemanha, o mercado é tão grande e evoluído que eventualmente surgem publicações capazes de ir além da qualidade dos plásticos, da potência desenvolvida ou dos níveis de consumos. Há repórteres que falam sobre a experiência de conduzir um determinado carro, que o comparam com outros e o coloca em situações reais ou demonstrativas da realidade.
Cá em Portugal ainda não chegamos lá. Quando ligamos a televisão e vemos um programa sobre automóveis, sabemos à partida o que o repórter vai fazer. Vai recitar o folheto informativo, enquanto um cameraman desinspirado segue o carro por umas estradas em Sintra ou no Guincho. Ao fundo, vai tocar uma música de elevador daquelas que se descarregam de graça da internet. Há uma obcessão pela “qualidade dos plásticos”, pelo “volume da bagageira” e pelos “consumos apresentados”.
A sério?? Um carro define-se pelos consumos, pelo toque dos plásticos e por quantos litros cabem na mala? Bom, a menos que me chame Tio Patinhas, passe a vida com as mãos no tablier e tenha o hábito de transportar líquidos, esta informação não é particularmente útil.
Porque não pegar num familiar, ir com ele de Caminha a Vila Real de Santo António, e relatar a experiência da viagem? Ou levar um citadino às compras e mostrar quantos sacos de supermercado cabem na mala? Há uma série de maneiras interessantes de falar sobre carros.
Pode estar a escapar-me alguma coisa, mas não entendo porque é que a nossa imprensa é tão asséptica e desenxabida. Acho que está na altura de se começar a falar de carros de outra forma. Uma forma que atenda mais àquilo que realmente nos leva, enquanto sociedade, a gostar tanto de conduzir que muitos de nós preferem gastar uma hora no trânsito do que passar vinte minutos no metro.
Os carros não são apenas máquinas.